segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

OS PROBLEMAS DA BIOÉTICA

OS PROBLEMAS DA BIOÉTICA


Por Prof Maurino Prim


Nos últimos decênios do século findo, as ciências biológicas conseguiram grandes avanços científicos e tecnológicos que causaram uma verdadeira revolução no campo da medicina, da veterinária e da agronomia. Técnicas novas foram criadas no manejo genético dos vegetais que fizeram surgir as espécies híbridas e transgênicas. Na área da veterinária as inovações foram significativas, principalmente com os cruzamentos genéticos de raças, com vistas a obter animais de melhores resultados sob o ponto de vista econômico. A maior das façanhas foi o feito de conseguir a criação de seres animais geneticamente idênticos, através da clonagem. Na área da medicina os avanços também foram grandes. Além dos modernos equipamentos atualmente disponíveis para a produção de diagnósticos mais precisos, como a ecografia e a tomografia computadorizada, a medicina especializou-se nos transplantes de órgãos e cogita-se no mundo científico a possibilidade de tornar realidade a clonagem de seres humanos.

Todos esses avanços, além dos benefícios que trouxeram para a humanidade, necessitam de uma reflexão sob a ótica ética, a fim de resolver e adequar essa ação humana dentro de práticas e limites que não extrapolem os princípios da moral e condicionantes restritivos de que essas ações estão afetas. A abordagem desses assuntos é quase sempre revestida de muita polêmica e pontos de vistas contraditórios que acabam, em via de regra, em infindáveis discussões, sem que se chegue a conclusões de consenso. A problemática justifica-se em face dos conceitos ou preconceitos divergentes que as correntes de opiniões alimentam sobre o assunto em tela. Nesta reflexão buscaremos discorrer sobre três vertentes que de alguma forma tem se posicionado a respeito das ações da ciência no campo da biotecnologia. São elas: 1) Visão científico/pragmática; 2) Visão ético/filosófica; 3) Visão teológica/religiosa.
VISÃO CIENTÍFICO/PRAGMÁTICA

Sob o ponto de vista puramente científico haveremos de reconhecer as significativas conquistas que a ciência biológica vem alcançando. São conquistas que vem prolongando a vida e, talvez, em busca de uma longevidade eterna. Seus resultados práticos e benéficos em prol da sustentabilidade da vida parecem quase justificar os meios e métodos utilizados em busca dos fins últimos pretendidos. É a racionalidade humana levada às últimas conseqüências, sem a necessária preocupação com princípios éticos, valores, essência e outros aspectos de natureza ontológica ou transcendental da humanidade.
O limite é definido pela capacidade e possibilidade de manipulação dos materiais biológicos, seja no manuseio de órgãos, tecidos, material genético ou embrionário. Costuma-se dizer que a ciência não tem fronteiras. Por mais absurda ou polêmica que possa parecer o invento de hoje, amanhã acaba sendo assimilado como sendo uma prática útil e benéfica para a humanidade. Foi assim quando começaram os primeiros experimentos de fecundação "in vitro" que fez surgir os bebês de proveta. Também geraram polêmica os primeiros transplantes de órgãos. Hoje essas técnicas são de uso generalizado na medicina e resolvidas sob o ponto de vista legal, ético e religioso.
Poderíamos concluir que enquanto a ciência avança e vai abrindo caminhos com as descobertas do manuseio seguro de materiais que sustentam a vida, seguem a reboque, as discussões sobre as implicações éticas que necessitam ser assentadas acerca dessas novas invenções. Assim renova-se o fluxo que avança historicamente de cujo processo parece restar uma só certeza. Não terá fim.

VISÃO ÉTICO/FILOSÓFICA

Tomando-se a reflexão sob o ponto de vista ético, vamos explorar as implicações legais e morais que necessitam estar equacionadas em todas a práticas humanas. Trata-se de colocar alguns limites nas pretensões afoitas de uma ciência que parece não querer freios. Esses limites tem por finalidade regular o manuseio dos materiais biológicos com vistas a impor mecanismos de controle e avaliação sobre os resultados dos experimentos científicos e tecnológicos, a fim de não oferecerem riscos quanto a segurança da vida, enquanto bem inalienável da humanidade. Essas discussões sustentam e renovam um dos objetos a epistemologia filosófica em seu campo mais específico da ética, da teleologia e da ontologia.
As perguntas nessa linha remetem a questão para as relações existenciais do ser humano enquanto ente constituído de essência e finalidade, cujos valores haverão de estar sempre assegurados em todas as ações institucionalizadas da humanidade. O feito ético desta forma justifica-se para impedir a proliferação desordenada de manipulações inconseqüentes que possam colocar em risco a vida ou a saúde do conjunto dos bípedes implumes, mais conhecidos por homens. Assim poderemos compreender a cautela e o caminhar lento das questões éticas, enquanto que a ciência avança de forma intrépida rumo a conquistas cada vez mais desafiadoras, superando sempre os seus próprios limites. A planificação legal da ação da medicina, da veterinária e da agronomia necessita estar balizada por parâmetros que dêem segurança aos agentes direta ou indiretamente envolvidos, seja como paciente ou como profissional. Na área da medicina discute-se a possibilidade da clonagem humana. O caminho para conseguir tal feito já está vislumbrado. A clonagem em animais já demonstrou que há a possibilidade de se fazer essa operação também em seres humanos. As questões ainda não respondidas, pela ciência, sobre o método da clonagem é que limitam a utilização dessa técnica de forma ostensiva. A grande dúvida está relacionada às conseqüências, anomalias e reações adversas que podem surgir no desenvolvimento do ente humano clonado. Por essa razão o freio ético torna essa prática, por enquanto, proibida pela ciência oficial da humanidade.
Na área da fitotecnologia temos a questão dos alimentos transgênicos. As discussões, polêmicas e dúvidas ainda não foram totalmente sanadas, embora em alguns países, a produção de alimentos geneticamente modificados esteja sendo feita. A dúvida que mais preocupa sobre a questão dos alimentos transgênicos está relacionada sobre os efeitos que eles podem causar ao meio ambiente e sobre o organismo humano em face do consumo prolongado desses alimentos. Enquanto estas dúvidas não forem esclarecidas haverá sempre alguém ou em país que ofereça restrições sobre os alimentos transgênicos. Quando a ciência conseguir provar a benecissitude dos transgênicos, tanto para o homem como também para o meio ambiente, eles serão incorporados no rol de mais uma das grandes conquistas e descobertas da ciência.

VISÃO TEOLÓGICO/RELIGIOSA

Toda essa questão necessita, também, estar ordenada e equacionada sob o ponto de vista teológico/religioso. Nessa reflexão precisamos invocar a transcendentalidade e espiritualidade do ser humano. Foi criado a imagem e semelhança de seu Criador - Deus - que o constituiu homem e mulher para dominar sobre todos os demais seres vivos da terra, conforme o capitulado no livro do gênesis da Bíblia. Ainda conforme o livro do Gênesis, Deus reservou para si a chave da vida. Isso significa compreender que a vida é dádiva de Deus. Somente a Ele cabe concebê-la e tirá-la. Essa prerrogativa não foi outorgada ao homem.
Sob este ponto de vista o homem jamais conseguirá plenos domínios sobre os mistérios da vida, pois este conhecimento é reservado ao Criador. As manipulações feitas pela ciência, seja através da inseminação artificial ou até a clonagem humana, não chegam a aviltar o supremo detentor da chave da vida, pois toda a vida concebida é por obra e consentimento de Deus. O que varia é o método. Porém, Deus, na sua infinita sabedoria e bondade é que avaliza, consente e aprova essas metodologias, quando faz prosperar a vida através de técnicas heterodoxas desenvolvidos pelo homem. Nessa linha de raciocínio pode-se argüir que não constitui-se uma ofensa ao Criador a utilização da fertilização "in vitro" para gerar os bebês de proveta, assim como também a utilização da clonagem para gerar seres geneticamente idênticos. Em ambos os casos, apenas muda o método. Deus faz brotar a vida.
As técnicas de transplantes de órgãos e tecidos também não ferem os princípios e dogmas teológicos. O corpo é o templo e o sacrário da alma. Enquanto a alma habita o corpo, ele é o templo que hospeda e sustenta o sopro de vida ali colocado por Deus. Depois que a alma deixa o corpo ela vira pó e retorna ao pó de onde veio. O caminho de retorno do corpo ao pó pode ser feita de diversas maneiras. As formas mais conhecidas são o sepultamento e a cremação. O cerimonial fúnebre está mais voltado a satisfazer aspectos culturais do que teológicos. A maioria das religiões não condena o uso de órgãos para transplante.
Os pecados mais graves cometidos pelo homem não estão, portanto, no uso de técnicas biomédicas que favorecem a vida e tentam prolongá-la e sustentá-la. Os problemas maiores estão centrados nas práticas que eliminam a vida, tais como o aborto e a eutanasia. Nessas ações o homem peca contra os preceitos do Supremo Criador, já que é Dele a exclusividade de tirar a vida. O aborto constitui-se, portanto, num crime de assassinato covarde, pois o feto ou o embrião não tem a mínima chance de defesa contra a ação avassaladora do homem. Sob o olhar de Deus, nenhuma forma de aborto está imune do julgamento divino, não importando a forma como o feto foi concebido. O que importa é que há uma vida que foi gerada por Deus e somente Ele pode interrompe-la.
Assim, para concluir, podemos argüir que os problemas da bioética não se resolverão de uma forma mágica da noite para o dia. Necessitam, isso sim, que as três dimensões aqui enunciadas estejam resolvidos no âmago da humanidade. O caminhar dessas questões são lentas por natureza, pois as implicações restritivas são de toda ordem. De um lado temos os limites da própria ciência e da tecnologia. De outro, temos os problemas éticos e teológicos. "Assim caminha a humanidade" dando conta dos seus desígnios legados pelo Criador.

Curitiba- PR, outubro de 2003

Prof Maurino Prim

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